O uso de plantas aromáticas
e medicinais contra
o envelhecimento cardiovascular

Isto é FMUC

O ‘Plants4Ageing: Potencial das Plantas Aromáticas e Medicinais no Envelhecimento Cardiovascular’ é um projeto de Investigação e Desenvolvimento (I&D) Mobilizador que obteve, em 2022, financiamento da Fundação "la Caixa", na quarta edição do Programa Promove, uma iniciativa desta fundação em colaboração com o BPI e a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).

Liderado por Mónica Zuzarte, investigadora do Instituto de Investigação Clínica e Biomédica da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (iCBR-FMUC), este é um projeto que, em traços gerais, pretende valorizar as Plantas Aromáticas e Medicinais através do desenvolvimento de um produto inovador que permita mitigar o envelhecimento cardiovascular e aumentar a qualidade de vida e o bem-estar das pessoas.


A constituição do consórcio
Tendo como entidade líder o Centro de Inovação em Biomedicina e Biotecnologia (CIBB), constituído pelo iCBR-FMUC e pelo Centro de Neurociências e Biologia Celular da Universidade de Coimbra (CNC-UC), o Plants4Ageing tem como entidades parceiras o Instituto Politécnico de Castelo Branco (através da Escola Superior Agrária e da Escola Superior de Saúde Dr. Lopes Dias), o Centro de Biotecnologia de Plantas da Beira Interior, a Universidade de Salamanca, o Centro Ciência Viva da Floresta de Proença-a-Nova e a empresa de investigação e produção em biotecnologia vegetal QualityPlant, contando ainda com a colaboração de investigadores da Faculdade de Farmácia e do Centro de Investigação em Engenharia dos Processos Químicos e dos Produtos da Floresta (CIEPQPF) da UC.

Apesar do consórcio alargado, Mónica Zuzarte afirma que foi muito fácil e natural a sua constituição aquando da candidatura do projeto ao Programa Promove, uma vez que todos os parceiros já se conheciam e tinham elaborado trabalhos em conjunto previamente.

“Porque esta era uma call que valorizava a contratação de mão-de-obra qualificada, tivemos ainda essa preocupação na elaboração da candidatura. Por isso, temos prevista a contratação de quatro pessoas: um investigador doutorado, um técnico e dois bolseiros. Deste modo, este é um projeto que envolve aproximadamente 20 colaboradores, distribuídos pelas diversas instituições do consórcio”, revela.

Com início em setembro de 2022, o Plants4Ageing é um projeto de 36 meses, tendo, assim, conclusão prevista para setembro de 2025. O seu financiamento total ronda os 311 mil euros, sendo que a Fundação “la Caixa” financia 80 porcento, ou seja, aproximadamente 250 mil euros. O restante financiamento é assegurado pelas entidades do consórcio.



Como surgiu a ideia para este projeto
“Na continuação do trabalho do grupo de investigação que integro, o G(u)IC [Group of Ubiquitin-dependent Proteolysis and Intercellular Communication], e da minha formação académica e do trabalho que desenvolvi no doutoramento, relacionado com o potencial de alguns extratos de plantas, nomeadamente dos seus óleos essenciais, surgiu esta ideia de apostar num conjunto de plantas da região de Castelo Branco, que já se tinham destacado enquanto detentoras de um potencial anti-inflamatório e anti-senescência. Nesse sentido, tínhamos já resultados preliminares interessantes, que mostravam que esses extratos poderiam ter algum potencial de combate ao envelhecimento”, contextualiza a investigadora principal deste projeto.

Deste modo, e conforme complementa Mónica Zuzarte, considerando que a call do Programa Promove pressuponha, para além do fomento de novos polos de desenvolvimento e atração de turistas e novos residentes, o investimento em regiões do interior e a valorização e gestão de recursos endógenos, “fez todo o sentido aliar os resultados preliminares da investigação feita pelo G(u)IC” a esses requisitos, apostando numa bioatividade direcionada ao envelhecimento cardiovascular.

























“O interesse pela componente cardiovascular advém do trabalho que o nosso grupo de investigação tem vindo a desenvolver, nomeadamente naquele que se relaciona com o potencial das plantas. A ideia de juntar essa componente ao envelhecimento diz respeito ao facto de a região de Castelo Branco ter uma população bastante envelhecida”, observa, “e foi na junção de todas estas nuances que surgiu a ideia do Plants4Ageing”.

A investigadora responsável salienta ainda que, na preparação da candidatura deste projeto ao Programa Promove, o apoio e papel ativo do Gabinete de Gestão de Investigação (GGI) da FMUC foi fundamental.

Mónica Zuzarte destaca, igualmente, a recetividade de todos os investigadores do G(u)IC, grupo liderado por Henrique Girão. “Haver esta abertura e liberdade de poder trabalhar com Plantas Aromáticas e Medicinais, numa área diferente daquela a que o grupo estava habituado, é algo pelo qual tenho de manifestar o meu reconhecimento e agradecimento”, frisa.


Os quatro pilares fundamentais

A par da componente científica, o projeto Plants4Ageing tem um forte cariz social, assentando, igualmente, numa componente formativa ampla. São quatro os seus pilares fundamentais: Conservação e Valorização, que dizem essencialmente respeito à componente científica, e Formação e Promoção, que dizem, respetivamente, respeito às componentes formativa e social.

No âmbito das atividades do pilar da Conservação, a ideia é a implementação de estratégias de conservação in vitro das plantas selecionadas. Serão, posteriormente, otimizadas as técnicas de micropropagação em larga escala para a espécie mais promissora em termos de bioatividade. O germoplasma será preservado por forma a evitar colheitas abusivas. “Esta propagação em larga escala visa a disponibilização, no final do projeto, destas plantas a algum produtor ou empresa que queira dedicar-se à sua produção, evitando, desta forma, a colheita no habitat natural”, salienta Mónica Zuzarte.

No pilar da Valorização, o “objetivo é acrescentar valor às Plantas Aromáticas e Medicinais, o que contribuirá para a diversificação económica e também para o desenvolvimento sustentável da região”. Uma vez que as espécies-alvo crescem naturalmente na região e mostraram já efeitos benéficos no sistema cardiovascular em ensaios prévios do grupo de investigação que Mónica Zuzarte integra, a vertente que se pretende explorar no âmbito deste projeto “tem por base o envelhecimento da população e a elevada prevalência das doenças cardiovasculares”.


Com efeito, embora as Plantas Aromáticas e Medicinais tenham sido exploradas em algumas vertentes, como, por exemplo, no que diz respeito à sua utilização para o melhoramento da memória ou para a estimulação cerebral, a nível cardiovascular desconhece-se ainda a existência de um produto que retarde a senescência, isto é, o envelhecimento dos tecidos.

“Por isso, e para concretizar este objetivo, os extratos volátil e fenólico das plantas vão ser isolados e caracterizados, para que depois possamos avaliar os potenciais anti-inflamatório e senoterapêutico em modelos de senescência”, avança.

Posteriormente, será também explorado o mecanismo de ação do extrato mais promissor e desenvolvido um método de encapsulação em vesículas extracelulares, garantindo a sua biodisponibilidade, eficiência e segurança. “No final, serão conhecidos o perfil químico das plantas-alvo e o extrato com efeitos mais promissores na inflamação e na senescência cardíaca e endotelial, e será desenvolvido um produto inovador para retardar o envelhecimento cardiovascular”, indica a investigadora responsável.

Com as atividades do pilar da Formação, “pretende-se criar um polo de formação especializada em Plantas Aromáticas e Medicinais”. Para isso, serão desenvolvidas e implementadas ações formativas, destinadas a produtores destas plantas e técnicos de propagação de material vegetal, alunos do ensino superior da área da Saúde e desempregados e população em geral.

“Através da aposta nesta aprendizagem especializada e direcionada, os formandos ficarão mais instruídos e preparados profissionalmente. Os produtores vão adquirir conhecimentos sobre propagação, colheita e obtenção de extratos, e os alunos do ensino superior poderão complementar a sua formação curricular com informação sobre a utilização tradicional destas plantas, possíveis interações medicamentosas e toxicidade. Por seu turno, a população desempregada terá a oportunidade de desenvolver ideias próprias de negócio que possam dar resposta a eventuais lacunas no mercado”, destaca Mónica Zuzarte.

Já no pilar da Promoção, serão desenvolvidas atividades integradas na iniciativa Escola Ciência Viva do Centro Ciência Viva da Floresta de Proença-a-Nova de consciencialização e motivação de crianças do 1º ciclo do ensino básico. Está também prevista a aposta num “formato disruptivo de promoção da literacia científica”, através da organização de um Encontro de Ciência, a decorrer nas festas da cidade em Castelo Branco. As tarefas desenvolvidas no âmbito deste pilar contam com o apoio do Laboratório de Comunicação em Saúde da FMUC.

“Nesse encontro, para o qual temos já o apoio da Câmara Municipal de Castelo Branco, pretendemos realizar workshops, palestras com cientistas convidados, conversas com seniores para recuperar saberes antigos e jogos educativos para os mais novos”, afirma. Deste modo, a investigadora responsável pelo Plants4Ageing acredita que este pilar contribuirá para uma sociedade mais envolvida com a ciência e mais consciente do valor do património local e da importância da sua preservação.

“Acredito que esta será uma parte muito importante e simbólica do projeto. É, no fundo, o culminar da parte científica e formativa do Plants4Ageing, que dará a conhecer à sociedade todo o trabalho realizado na região”, enfatiza.


Os objetivos e impacto esperados
O Plants4Ageing tem quatro objetivos fundamentais, que refletem os seus quatro pilares. Visa, antes de mais, o desenvolvimento de um extrato/composto encapsulado com potencial para retardar o envelhecimento cardiovascular. De igual modo, pretende alcançar a otimização de técnicas de cultura in vitro para a preservação e produção em larga escala das espécies selecionadas. O projeto pretende também criar um polo de formação especializada em Plantas Aromáticas e Medicinais em Castelo Branco e, por fim, promover a literacia científica e uma maior aproximação entre os cientistas e a sociedade.

“Além disso, o projeto dará também visibilidade à região, potenciando o turismo, já que as atividades no âmbito do pilar da Promoção mobilizam a sociedade e dinamizam, deste modo, a economia local”, acrescenta Mónica Zuzarte.


O fascínio pelas plantas aromáticas e medicinais
Licenciada em Biologia, Mónica Zuzarte afirma que o gosto pela área das Plantas Aromáticas e Medicinais, considerando as suas aplicações tradicionais e propriedades terapêuticas, começou na altura em que se encontrava a desenvolver a sua investigação de mestrado.

“Fiz o mestrado na área da Biotecnologia Vegetal. Aí, avaliei o potencial bioativo de óleos essenciais de uma espécie particular – a Lavandula pedunculata – e fiz toda a parte de propagação in vitro, o que me permitiu alargar o conhecimento em biotecnologia vegetal”, conta.

O doutoramento, afirma, resultou numa extensão do gosto por estas plantas e dos conhecimentos adquiridos no mestrado. “O que fiz foi alargar o trabalho às restantes lavandulas que crescem espontaneamente em Portugal”, indica. “São cinco espécies. Avaliei o potencial bioativo dos extratos voláteis, ou seja, dos óleos essenciais com aplicabilidade na saúde, particularmente a atividade antifúngica e anti-inflamatória”, acrescenta.

“Uma vez que, no doutoramento, apenas avaliei o potencial destes compostos in vitro, ou seja, havia uma lacuna de ensaios de validação in vivo, envolvendo experimentação animal, estive depois um ano nos Estados Unidos da América [EUA], na Harvard Medical School, onde, aí sim, tive contacto direto com alguns modelos animais de doença”, refere.

Enquanto ainda estava nos EUA, “surgiu a oportunidade de voltar para Coimbra”, dada a existência de uma vaga para técnica de microscopia. “Como tinha alguma experiência em microscopia, nomeadamente eletrónica, concorri para essa posição e voltei para Portugal”.


Assim, Mónica Zuzarte está no iCBR-FMUC desde 2014. Hoje, mantém-se ligada à microscopia eletrónica, mas desde 2018 ocupa o cargo de investigadora deste instituto, o que lhe possibilitou retomar o trabalho de investigação. “No fundo, sempre fui fazendo investigação, nomeadamente através de colaborações na área das plantas, mas este contrato de investigadora permitiu-me voltar à investigação com óleos essenciais, em colaboração com a Faculdade de Farmácia da UC, bem como a esta ligação à biotecnologia”, observa.

A maior dificuldade que enfrenta no seu trabalho, indica, é conseguir conciliar o trabalho de investigação com o trabalho de microscopia eletrónica. “O interessante é que, apesar de essa ser a maior dificuldade, é também aquilo de que mais gosto”, assegura. “Gosto muito desta diversidade de tarefas. Aliás, aborreço-me facilmente com a monotonia!”, refere.

“A microscopia dá-me o prazer particular do desafio: todos os trabalhos e requisições que me chegam são diferentes e requerem um estudo, uma aprendizagem… Conseguir responder às perguntas que me colocam e ver as pessoas satisfeitas com os resultados obtidos é o que mais me agrada”, garante.

“Mas obviamente que tenho um gosto enorme pela investigação. E, considerando o meu trabalho, quando conseguimos convencer a comunidade médica da eficácia da utilização de produtos naturais, mostrando que as moléculas naturais são avaliadas e testadas da mesma forma que uma molécula sintética, e que precisam de cumprir os mesmos requisitos de eficácia, segurança e toxicidade… esse é, sem dúvida, um ponto alto do trabalho”, conclui.

por Luísa Carvalho Carreira
fotografias gentilmente cedidas por Mónica Zuzarte