É a presidente do Núcleo de Estudantes de Medicina da Associação Académica de Coimbra (NEM/AAC) desde maio deste ano. Há três anos a desempenhar diversas funções neste núcleo, Maria Loio dá conta dos principais objetivos do seu mandato e fala da importância do associativismo na sua vida.
Em traços gerais, como descreve o Núcleo de Estudantes de Medicina da Associação Académica de Coimbra (NEM/AAC)?
É difícil explicarmos o que é o NEM/AAC, porque muitas pessoas olham para nós vendo apenas a nossa vertente major, que é a representação estudantil: obviamente que sim, mas o NEM/AAC não é só isso.
Promovemos imensas atividades nas quais os estudantes podem envolver-se, não só enquanto participantes, mas também na sua organização e componente criativa. Por isso, costumo dizer que o NEM/AAC não é apenas um espelho dos estudantes ou apenas uma máquina de atividades.
No NEM/AAC, propomos, diariamente, fazer algo diferente da Medicina – embora ela esteja sempre lá de alguma forma – ao mesmo tempo que tentamos perceber o que é a essência de cada pessoa que compõe o núcleo.
Somos uma equipa que, para além de tentar perceber o que acontece nos vários anos do MIM [Mestrado Integrado em Medicina] e de dar resposta às muitas dúvidas dos alunos, tenta também perceber quais são as necessidades que os estudantes têm e que não podem ser colmatadas pelo nosso currículo médico.
Isto porque ser estudante de medicina pressupõe, creio eu, uma vontade intrínseca de ajudar o outro, mas às vezes essa ajuda não diz respeito apenas às competências clínicas que nós, a priori, vamos adquirindo e desenvolvendo, mas sim a muitas outras vertentes que tentamos desenvolver no núcleo.
No NEM/AAC, temos cerca de dez departamentos, para além de grandes projetos em diferentes áreas, sejam elas científicas, humanísticas ou mais criativas. E fazer parte de tudo isto é fazer parte do NEM/AAC, é fazer parte desta roda gigante.
Quais os principais objetivos do atual mandato do NEM/AAC, e o que já foi sendo feito desde que assumiu a sua presidência?
No início, foi um pouco difícil definirmos objetivos, por estarmos num contexto pandémico e sem conseguirmos perceber o que poderíamos esperar a curto prazo, por exemplo, em termos de retorno às atividades letivas presenciais.
Nessa fase, queríamos tentar, o mais rapidamente possível, colmatar as falhas que os alunos tinham sentido por terem ido para casa devido à pandemia. Logo no início do mandato, desenvolvemos a atividade ActiveMed, na qual, através da organização de vários workshops científicos e clínicos, os alunos aprendiam determinados gestos [clínicos] que, com a pandemia, acabaram por ficar um pouco esquecidos.
Tínhamos muita vontade de voltar à vertente presencial, criando atividades novas que convidassem os alunos a saírem desta inércia, já que, por muito que queiramos voltar à atividade presencial, há uma evidente inércia, tanto da parte dos estudantes como da comunidade, como um todo, para voltar ao normal, ou ao novo normal.
Para isso, tivemos de nos reinventar e criar coisas novas. Uma delas, que temos agora em mente e que acho que é uma excelente ideia, é a organização de uma corrida solidária, que é algo que nunca fizemos e que pretende envolver os estudantes, mas também toda a comunidade de Coimbra.
Os nossos grandes objetivos pautam por chamarmos mais as pessoas para o núcleo, ou seja, promovermos o envolvimento estudantil e das pessoas no nosso núcleo. Aliás, quando nos candidatámos, a nossa lista era, precisamente, a Lista P, das “Pessoas”. Depois, o outro objetivo tem a ver com outro “P”, o da “Pandemia”, que era percebermos o que podíamos fazer em prol dos estudantes, considerando a atual situação pandémica.
E para além da pandemia, quais têm sido os principais problemas e dificuldades enfrentados por este núcleo?
Penso que, considerando o meu mandato em particular, temos tido alguma sorte. Pessoalmente, estou no núcleo há três anos, por isso lidei com a pandemia desde o início e já sei como agir em determinadas situações.
Ainda assim, as nossas atividades para este mandato foram pensadas considerando, essencialmente, um registo presencial, por isso uma das maiores dificuldades que tivemos foi a de precisarmos de ter sempre um Plano B, no qual essa mesma atividade decorreria online, ou até a de precisarmos de pensar, desde logo, um Plano A que fosse também online.
Em termos da representação estudantil, creio que a maior dificuldade é, novamente, a questão da inércia de que falava. Queremos muito voltar às atividades presenciais, mas temos de perceber se queremos mesmo todos que assim seja. Eu posso achar que a opinião dos alunos é a de que devemos voltar ao registo presencial, mas para isso tenho de os sondar, de fazer questionários, para perceber se essa é realmente a vontade deles. Precisamos de números exatos para dizer qual é a verdadeira opinião dos alunos, e às vezes os números não batem certo com o que perspetivámos. Se calhar, há alunos que consideram mais cómodo estarem em casa, e nós também compreendemos isso e percebemos possa ser uma forma mais fácil de os alunos terem acesso aos materiais, por exemplo.
Dizia que alguns alunos consideram mais cómodo estar em casa. Mas considera que é igualmente eficiente em termos de aprendizagem?
Não. Sem dúvida que não, nem para a nossa saúde mental, porque, estando em casa, é muito difícil distinguirmos aquilo que é o nosso espaço laboral ou de estudo do nosso espaço de lazer, nem pelo facto de estarmos presos a um ecrã para termos aulas, porque dessa forma não temos praticamente interação com os nossos professores.
Desde o início do seu percurso enquanto estudante da FMUC, tem estado ligada ao associativismo, tanto no NEM/AAC – onde já está há três anos, como referiu – quanto na Associação Nacional de Estudantes de Medicina (ANEM). Como surgiu na sua vida e que significado tem para si a participação associativa?
Surgiu de uma forma engraçada! Quando conto esta história, as pessoas riem-se imenso. No NEM/AAC, na altura em que chegam os nossos caloirinhos, fazemos sempre uma espécie de feira dos departamentos do núcleo para que eles os fiquem a conhecer.
Foi assim que eu própria comecei por conhecer o núcleo, enquanto caloira. A iniciativa chamava-se How I Met NEM/AAC, fazendo o paralelismo com a série [How I Met Your Mother], e houve alguns departamentos que chamaram a minha atenção. O que podíamos fazer era deixarmos o nosso número de telemóvel e o nosso endereço e-mail, para que os elementos do NEM/AAC nos adicionassem depois a um grupo do Facebook ou nos enviassem uma mensagem a dizerem para aparecermos numa das suas reuniões. E eu comecei a fazer parte de alguns grupos, mas, como era caloira e estava tanta coisa a acontecer, nunca mais me lembrei daquilo.
Um dia, apercebi-me de que ia haver uma atividade do núcleo que achei interessante, e que dizia respeito a uma feira de mobilidade. E eu decidi inscrever-me para ir a essa feira. Acontece que eu ainda não conhecia muito bem os espaços da faculdade… Por isso, em vez de ir a essa feira, entrei, por engano, numa reunião do NEM/AAC. E achei aquilo fascinante! Não era uma reunião sobre mobilidade, mas era sobre Saúde Pública, algo que adoro, e foi assim que comecei a minha vida no núcleo. Acabei por ficar nessa reunião e percebi que existe mesmo muita facilidade em fazermos parte deste núcleo. Basta, literalmente, irmos a uma reunião: aparecemos, somos bem-vindos e, se quisermos, ficamos por lá.
O porquê de andar nestas andanças do associativismo… acho que é pela vontade que todos temos, de alguma forma, de querer mudar o mundo, deixando-o um pouco melhor do que aquilo que ele já é. E, como no NEM/AAC trabalhamos com diversas vertentes, acabamos por ter essa possibilidade.
Por exemplo, sempre fui apaixonada pela área da Saúde Mental e pela importância de falarmos sobre o tema abertamente. No meu primeiro ano no núcleo como coordenadora, coordenei o Departamento de Saúde Pública, Reprodutiva e Ambiental e, na parte da Saúde Pública, senti que a Saúde Mental não estava a ser muito trabalhada. E então percebi que tinha ali um espaço para começar a falar sobre o tema, até numa perspetiva mais abrangente, dado que, por fazer parte desse departamento, era, automaticamente, a representante local da Saúde Pública da ANEM. Na altura, escrevemos até uma tomada de posição, da ANEM, que foi levada ao Conselho de Escolas Médicas Portuguesas [CEMP], acerca da saúde mental dos estudantes de Medicina.
No ano passado, acabei por ser vice-presidente interna, que, no fundo, é um cargo que pretende envolver toda a equipa de direção, fazendo com que se sintam em família quando trabalhamos e que percebam que não têm um cargo único, solitário. Acho que isso é muito importante quando falamos de estudantes que vão ser médicos e trabalhar em equipas multidisciplinares, e que, por isso, podem sempre pedir ajuda a outra pessoa que esteja com eles. Foi assim que também acabei por ficar com uma visão mais abrangente do NEM/AAC como um todo, e foi isso que me motivou a candidatar-me à presidência do núcleo este ano.
Acho que é o facto de perceber que, se me interessar em algo e envolver-me nisso, vejo coisas boas a acontecerem e torno o mundo um bocadinho melhor que me faz continuar no associativismo.
Depreendo que a participação associativa seja algo a manter no seu futuro,
já enquanto médica.
Acho que sim. Acho que faz todo o sentido. Acredito que quem sabe de Medicina, quer vivê-la numa plenitude tal que pretende, além de ser clínico, ser muito mais do que isso e continuar a ajudar as pessoas noutras vertentes.
Está sensivelmente a meio do seu mandato como presidente do NEM/AAC, que termina em maio do próximo ano. Em termos pessoais, como tem sido a experiência?
Agridoce. Porque, apesar de ser uma experiência extremamente gratificante, nem tudo é fácil, como é óbvio. Gerir a carga de trabalho do núcleo com as aulas não é fácil, sobretudo se tivermos em conta que estamos numa pandemia, em que os limites entre o que é período laboral e o que é período de lazer se vão perdendo.
Às vezes, é difícil perceber quando é aceitável dizer que não posso fazer uma reunião num dado momento porque preciso de fazer algo relativo aos meus estudos. Essa tem sido a minha maior dificuldade enquanto presidente. Mas, por outro lado e como dizia, tem sido extremamente gratificante, porque tem havido um grande envolvimento estudantil. Esse envolvimento é notório nas nossas atividades.
Este ano, tomámos, na direção, a decisão de nos irmos apresentar a todos os que fazem parte do NEM/AAC, mesmo àquelas pessoas que não têm um coordenador na nossa direção, por fazerem parte dos grandes projetos, nos quais há comissões organizadoras autónomas. Mas nós queríamos ir apresentar-nos também a essas pessoas, dizer-lhes que podem contar connosco mesmo estando um pouco mais afastadas em termos das atividades que desempenham.
E foi muito fixe! Fui discursar a cada uma destas equipas, falar-lhes um pouco sobre o NEM/AAC e dar-lhes as boas-vindas. Acho que foi um dos momentos de que mais me orgulho no meu mandato, porque fez com que as pessoas soubessem realmente o que é o NEM/AAC
e quisessem falar connosco. Essa interação foi muito boa.
No início desta minha resposta, descrevi a experiência como agridoce porque, quando o mandato começou, senti algumas dificuldades, mas também porque, agora, não tenho problemas em mostrar vulnerabilidade. Acho até que fazê-lo é algo muito importante, mostrar que também preciso de ajuda e ter a direção do NEM/AAC a reorganizar-se também sempre que alguém precisa de apoio.
Por exemplo, agora vamos entrar numa fase em que os alunos começam a falar muito sobre a mobilidade, porque têm de fazer a sua candidatura até ao final do próximo mês de janeiro.
E, como é óbvio, os alunos têm muitas dúvidas, porque apesar de haver regulamentos, há sempre questões práticas e mais específicas que não ficam totalmente esclarecidas.
Nós temos uma coordenadora da área de Erasmus, mas o que acontece é que, coincidindo as candidaturas à mobilidade com uma altura intensa de avaliações, é uma sobrecarga gigante apenas uma pessoa ficar a tomar conta desta área. Então, o que acabámos por fazer foi dizer-lhe “miúda, se estivesse no teu lugar, ia precisar de ajuda; portanto, vamos aqui pensar numa forma de dividirmos tarefas”. Agora, trabalhamos nesse assunto por escalas: eu despendo de uma hora do meu dia para responder às dúvidas dos estudantes sobre mobilidade, há outra pessoa a despender de mais uma hora e mais outra pessoa a despender de outra hora.
É sempre nesse sentido que nos vamos organizando, em conjunto.