Estudo revela elevada agressividade terapêutica em fim de vida para doentes oncológicos
Sobre o estudo
A agressividade dos cuidados em fim de vida do doente oncológico é um tema de grande relevância clínica e social. Estudos qualitativos internacionais demonstram que os doentes desejam evitar tratamentos excessivamente agressivos que comprometam a qualidade de vida no seu fim (Heyland et al. 2006). Urge identificar os doentes em maior risco de cuidados agressivos em fim de vida.
Apesar do crescimento do número de equipas de cuidados paliativos nos últimos anos, os recursos afetos a estes cuidados são escassos e têm cobertura geográfica assimétrica a nível regional e de tipologia. Apenas cerca de 25% portugueses em idade adulta recebem apoio destas equipas, deixando muitos portugueses sem acesso a cuidados paliativos (Capelas et al. 2019).
Este projeto trata-se de um estudo observacional retrospetivo que incluiu todos os adultos com diagnóstico de cancro que faleceram num hospital público de Portugal continental entre janeiro de 2010 e dezembro de 2015, identificados a partir da Base de Dados de Morbilidade Hospitalar. A agressividade dos cuidados oncológicos em fim de vida foi medida através da presença de pelo menos 1 de 16 indicadores individuais nos últimos 30 dias de vida. Estes indicadores foram identificados na literatura e validados por um painel de peritos nacionais.
Resultados e impacto
O estudo incluiu 92.155 doentes e demonstra que Portugal apresenta uma elevada prevalência de agressividade terapêutica em fim de vida para doentes oncológicos – 7 em cada 10 que morreram num hospital público em Portugal continental entre 2010 e 2015 foram expostos a cuidados considerados excessivamente agressivos. Esta constitui uma das maiores prevalências de agressividade terapêutica em fim de vida para doentes oncológicos entre os países ocidentais (71 vs 22-65%).
O indicador individual de agressividade mais comum nos últimos 30 dias de vida foi o internamento hospitalar por mais de 14 dias (43 vs 11-30%). Num contexto de acesso tendencialmente gratuito aos cuidados hospitalares, este internamento pode ser fortemente induzido por ausência de apoios clínicos e sociais na comunidade.
Fatores relacionados com um melhor entendimento da evolução clínica, como idade avançada, cancro de mama e doença metastática foram associados a menor risco de receber cuidados agressivos.
Por outro lado, doentes com necessidades mais complexas ou cujo prognóstico seja mais imprevisível, como aqueles com mais doenças associadas e cancro gastrointestinal ou hematológico, estão expostos a maior risco de cuidados agressivos. O óbito num centro oncológico ou num hospital com serviço de oncologia médica está também associado a aumento de risco.
Bárbara Gomes
Diogo Martins Branco
Fotografia de Daan Stevens @ Unsplash