Laboratório
COVID-19 UC

Isto (também) é FMUC

Devido à pandemia de COVID-19, os nossos hábitos e rotinas alteraram-se, de um momento para o outro. Aqueles hábitos e rotinas que julgávamos adquiridos, e que aconteciam, em grande parte, fora das nossas casas. De repente, o que era tido como normal foi desaconselhado, e o melhor a fazer passou a ser “ficar em casa”, expressão que, agora, ouvimos vezes sem conta e que cumprimos, tentando adaptar-nos a esta nova e indesejável realidade, enquanto esperamos que dure pouco.

Ficamos em casa, mas nem todos ficam. Nem todos podem, e nem todos querem ficar, por sentirem que têm outra forma de dar o seu contributo para que o momento presente que vivemos se torne, rapidamente, passado. Há pessoas que continuam a trabalhar para que tenhamos todos acesso a serviços e bens essenciais e há profissionais de saúde que continuam a dar o seu melhor, no trabalho que desempenham e na linha da frente do combate a este vírus, do qual tanto se fala e ainda pouco se sabe.

Mas há também pessoas que se voluntariam e que dão, de forma altruísta, o seu tempo, conhecimento e experiência para, de diferentes formas, ajudar quem precisa e fazer frente à atual pandemia. Exemplo disso são os cerca de 80 voluntários que, distribuídos por nove equipas, desde o início de abril se dedicam à realização de testes de diagnóstico de COVID-19, no laboratório que a Universidade de Coimbra (UC) implementou no Polo I da Faculdade de Medicina (FMUC) para o efeito.


Isto é FMUC
Estas equipas contam com profissionais da UC, do Instituto de Investigação Clínica e Biomédica de Coimbra (FMUC-iCBR) e do Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC), centros de investigação da Universidade, mas também com profissionais do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC) e do Instituto Português do Sangue e da Transplantação (IPST).
Aqui, damos a conhecer a equipa liderada por Henrique Girão, constituída por professores, investigadores, técnicos de laboratório, técnicos de microscopia eletrónica e alunos de doutoramento da FMUC e do FMUC-iCBR.

A preparação para um turno no laboratório
As equipas de voluntários trabalham em turnos de cinco horas, mas ainda antes do trabalho poder começar, há procedimentos de segurança a serem escrupulosamente respeitados. Depois de entrarem no edifício do Polo I da FMUC e enquanto se dirigem ao andar onde fica o laboratório preparado para os testes de diagnóstico de COVID-19, os membros da equipa desinfetam as mãos e colocam uma máscara cirúrgica.
Seguidamente, vão para os balneários, conforme explica Ana Sofia Brigas: “Aqui, substituímos a roupa que trazemos da rua por um pijama médico, e o calçado por umas sapatilhas que já nunca sairão do laboratório, a não ser para irem diretamente para o lixo, quando isto acabar”. Depois, a equipa volta a reunir-se à entrada do laboratório, para trocarem informações e receberem “indicações sobre o trabalho a realizar, que pode variar desde completar trabalhos pendentes do turno anterior, repetir análises pontuais ou rececionar amostras novas”, refere Mónica Zuzarte.

Isto também é FMUC

O passo que se segue é a conclusão da colocação de todo o equipamento necessário, tarefa que se realiza numa sala de pressão negativa, na qual os membros da equipa entram em momentos distintos. Primeiro, entram as quatro voluntárias que estarão depois nas câmaras de inativação: Diana Adão, Tânia Martins Marques, Mónica Abreu e Teresa Rodrigues, que, por cima do pijama cirúrgico, têm ainda de vestir um fato de proteção integral e uma bata fluido-resistente, colocar dois pares de luvas, dois cobre-sapatos, um par de óculos de proteção e uma touca e substituir a máscara cirúrgica, inicialmente colocada, por uma máscara N95/PFF2, que oferece maior capacidade protetora. Convém salientar que a colocação deste equipamento não é aleatória, seguindo antes uma ordem específica: “Temos sempre uma cábula para garantir que estamos a fazê-lo de forma correta”, esclarece Diana Adão.

Depois, entram os elementos responsáveis pela receção de amostras, Ana Sofia Brigas e Mónica Zuzarte, os voluntários que ficam a cargo da técnica de laboratório RT-PCR, Carla Marques e Steve Mendes Catarino e o líder da equipa, Henrique Girão, que se equipam ainda com uma bata fluido-resistente, proteção para o calçado e luvas. Findo este metódico processo, a equipa está apta para, finalmente, poder colocar mãos à obra.

A divisão de tarefas e o indispensável contributo de todos

O processo para a realização de testes de diagnóstico à COVID-19 está dividido em três etapas: receção, inativação e análise das amostras que chegam ao laboratório.


Isto é FMUC

É Ana Sofia Brigas quem recebe as amostras vindas diretamente do exterior, registando-as no sistema informático e fazendo a impressão das respetivas etiquetas identificativas. A partir deste momento e conforme faz saber, “toda a comunicação passa a ser feita através de gestos, palavras escritas em papel ou escritas em espelho [da direita para a esquerda] nos vidros e usando, claro, o bater nos vidros como forma de chamamento ”, já que, depois de registadas e identificadas, transporta as amostras até uma caixa de passagem (caixas constituídas por duas portas que apenas se abrem à vez, evitando o contacto entre salas), com acesso direto a uma antecâmara.

Nessa antecâmara encontra-se a responsável pelo segundo momento da receção das amostras, Mónica Zuzarte, que as recebe, distribui a solução de inativação pelos respetivos tubos a serem utilizados na fase seguinte e passa, quer as amostras, quer os tubos, para as colegas que estão nas câmaras de inativação, também através de uma caixa de passagem. Para além destas tarefas, repõe ainda os stocks de material e observa atentamente estas colegas, por forma a dar uma resposta rápida a todas as suas solicitações.

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Existem duas câmaras de inativação de amostras: numa das câmaras encontram-se Diana Adão e Tânia Martins Marques e na outra estão Mónica Abreu e Teresa Rodrigues. É, então, nestas câmaras que se procede à inativação do vírus. Como explica Mónica Abreu, “as amostras, após serem recolhidas, são mantidas num frasco com um líquido, e podem conter partículas virais, capazes de nos infetar”. Assim, nestas zonas de inativação, “o potencial viral das amostras é neutralizado pela adição de uma solução de inativação”. Desta forma, e conforme complementa Tânia Martins Marques, é garantido que as amostras “deixam de representar um perigo para os colegas que as vão receber na estação seguinte”.

É na estação seguinte que estão Carla Marques e Steve Mendes Catarino, responsáveis pela análise das amostras, ou seja, pelo exame de diagnóstico propriamente dito, feito através de uma técnica de laboratório, chamada RT-PCR, que permite a pesquisa de material genético viral na amostra.

Ao longo destas três etapas, Henrique Girão supervisiona o trabalho de toda a equipa, “estando em constante movimento de forma a coordenar o fluxo de amostras e a orientar e responder às solicitações da equipa”, conforme explica Mónica Zuzarte.


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Por fim, depois de uma árdua jornada de trabalho, da reposição de stocks e de uma nova higienização dos espaços utilizados (que são igualmente higienizados no início de cada turno), a equipa pode, finalmente, colocar todo o “equipamento utilizado em recipientes de lixo apropriados e os pijamas cirúrgicos para lavagem”, tal como indica Carla Marques. Agora, é altura de voltarem a vestir as suas roupas, que, conforme diz em tom de brincadeira Mónica Abreu, “embora não sejam o último grito no que diz respeito à moda internacional, são nossas e gostamos muito delas” e seguirem para casa, cumprindo o isolamento social a que todos estamos sujeitos. 


As razões que os levaram a voluntariar-se

“Senti que poderia fazer algo útil e que, mesmo que quase insignificante num contexto individual, pudesse, num conjunto, contribuir para algo maior e significativo”. As palavras são de Teresa Rodrigues, mas, na verdade, poderiam ser de qualquer um dos membros desta equipa, já que todos partilham o mesmo sentimento que os levou a voluntariarem-se neste laboratório.  


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Por isso, e assim que esta oportunidade para se voluntariarem surgiu, todos se mobilizaram para, prontamente, ajudarem naquilo que pudessem, dentro das suas competências técnicas e com a manifesta preocupação pelo facto do País ter uma capacidade limitada para a realização de testes de diagnóstico, necessária para ajudar a controlar a pandemia, conforme referem Steve Mendes Catarino e Carla Marques.

As peculiares formas de comunicação no laboratório

Como será fácil compreender, pelo facto de todos os espaços de trabalho estarem separados por caixas de passagem, a comunicação entre os membros da equipa é, no mínimo, desafiante: “na maior parte das vezes, tento comunicar por gestos, mas isso não é fácil quando a parte inferior dos nossos rostos está por detrás de uma máscara”, indica Steve Mendes Catarino.  

Tal como explica Diana Adão, a comunicação é feita, maioritariamente, por Henrique Girão, que, através “das janelas de vidro que dão para os corredores” ou de mensagens escritas numa folha, vai passando informação importante e pedindo feedback a toda a sua equipa.


Uma experiência inesperada, mas enriquecedora

Tal como quando questionados acerca da razão que os levou inscreverem-se como voluntários no Laboratório COVID-19 UC, as opiniões dos membros da equipa são unânimes ao relatarem como tem sido esta nova experiência: enriquecedora, gratificante, interessante, desafiante e estimulante são, por isso, exemplos de adjetivos a que naturalmente recorrem para descrever esta etapa das suas vidas.  

Isto é FMUC

Para Henrique Girão, esta experiência tem sido um “verdadeiro exercício de team building”, salientando, igualmente, o “grande espírito de solidariedade, partilha e união” que este trabalho tem fomentado entre todos, pelo facto do trabalho de cada um contribuir, de “forma direta e decisiva, para o resultado final”. Por isso, e apesar das circunstâncias, esta experiência tem-se revelado marcante para todos, embora, tal como refere Carla Maques, estas circunstâncias suscitem “alguma apreensão em relação ao futuro e ao fim deste problema mundial”.

Enquanto não regressamos a uma desejada normalidade, que ainda não sabemos muito bem como será, ou às rotinas que, afinal, descobrimos terem mais de fundamentais do que de aborrecidas, deixamos, a todos aqueles que se mobilizam de forma generosa para dar o seu melhor no combate a esta estranha situação, o nosso agradecimento e o nosso aplauso, (por agora) virtual.

por Luísa Carvalho Carreira (texto e fotografia de topo) 
fotografias de Henrique Girão