Instituto de Imunologia

Isto é FMUC

Com cerca de cinco décadas de história, o Instituto de Imunologia fica localizado no terceiro andar do edifício da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC) do Polo I, do lado da Rua Larga. Na sua coordenação desde os anos 90 está Manuel Santos Rosa, que nos dá a conhecer a evolução e o trabalho desta estrutura orgânica da Escola.


A investigação, o ensino e a atividade laboratorial
Os principais objetivos deste instituto são a promoção da investigação e do trabalho laboratorial na Imunologia – área transversal à maioria das especialidades médicas –, e o apoio às unidades curriculares de Imunologia I e II do Mestrado Integrado em Medicina (MIM), de Imunologia do Mestrado Integrado em Medicina Dentária (MIMD), bem como de outros mestrados, licenciaturas e do Programa de Doutoramento em Ciências da Saúde da FMUC, nos quais há uma participação docente ativa da área da Imunologia.

Embora, durante algum tempo, tenha ainda existido uma quarta vertente do Instituto de Imunologia, a da prestação de serviços à comunidade, neste momento essa vertente encontra-se praticamente inativa, conforme indica Manuel Santos Rosa. “Neste momento, essa vertente existe apenas de forma muito discreta. Isso acontece porque tudo aquilo que são análises correntes de Imunologia são feitas por qualquer laboratório, pelo que não se justifica prestarmos também esse serviço. Esse foi sempre o nosso entendimento e também o das várias direções da FMUC: não devemos prestar um serviço que, de certa forma, seja redundante, pelo facto de estar disponível na maioria dos laboratórios. O centro da nossa intervenção são estudos imunológicos especializados e vocacionados para a investigação, especialmente de interesse clínico”, explica.


A importância da interpretação dos dados científicos
“A Imunologia é muito interpretativa, e essa é uma característica que deveria ser motivada, ou seja, deveria existir mais trabalho interpretativo analítico em Portugal nesta área”, declara o diretor do instituto, “tal como acontece noutros países, em que este trabalho já é do domínio comum”.


A este respeito, Manuel Santos Rosa dá o exemplo daquilo que se tem passado com os dados relacionados com a pandemia de COVID-19. “Pura e simplesmente, um resultado é visto apenas como um número, e isso não deveria acontecer. Ouvimos falar muito, a propósito deste contexto pandémico, das taxas de anticorpos, mas a interpretação dessas taxas é extremamente importante”, observa, constatando, de igual modo, que, no País, pouco tem sido o trabalho feito nesse sentido. “Diria que, neste momento, temos comentadores a mais e pessoas que interpretem realidades científicas a menos”, constata.


As lições da atual pandemia
Questionado acerca do modo como perspetiva o futuro do atual contexto pandémico, Manuel Santos Rosa diz, em tom de brincadeira, que, “o futuro, só os futurologistas o saberão”, considerando, no entanto, que o presente nos deve transmitir uma ideia importante: a de que devemos aprender com as experiências vividas, para que não voltemos à estaca zero.

“Creio que esta pandemia nos surpreendeu por vários motivos, entre os quais a sua extensão e a sua duração. Falamos de um vírus que, embora utilize recetores muito presentes no nosso organismo e tenha facilidade em transmitir-se e infetar-nos, tem sido apenas moderadamente ofensivo”, indica. Assim, “embora a mortalidade deste vírus seja preocupante em termos globais, a ser mais elevada teria sido uma calamidade. Mas atenção que ainda estão em observação os problemas de saúde mais tardios que dele possam depender”.

O diretor do instituto de Imunologia defende, por isso, que a normalidade só deverá regressar quando o vírus estiver a transmitir-se de forma residual. “No futuro, e por alguma mutação que sofra, este vírus, ou até outro, pode colocar-nos diante de cenários muito semelhantes, ou inclusivamente piores. Se, de repente, quisermos voltar à normalidade total, como se nada estivesse a acontecer, continuaremos sempre a ter os mesmos problemas. Devemos aprender com tudo aquilo que estamos a viver agora”, enfatiza.


A assinalável longevidade do instituto
Tal como faz saber Manuel Santos Rosa, a atividade do instituto começou no início dos anos 70 do século passado, quando a Imunologia era uma área emergente. “Na altura, era o Laboratório de Imunologia – não era o Centro de Imunologia, designação que teve depois, nem o Instituto que é hoje –, e as suas funções foram iniciadas pela mão do Professor António José de Amorim Robalo Cordeiro”, conta.

Àquela data, o Laboratório de Imunologia prestava apoio à unidade curricular de Patologia Geral, “e o Professor tinha por hábito convidar os alunos a visitarem o laboratório e a participarem nas suas atividades”. Manuel Santos Rosa começou, deste modo, a colaborar no Laboratório de Imunologia, quando se encontrava ainda no segundo ano do curso de Medicina da FMUC.

“Fiz parte de um grupo de três colegas de curso que se juntou e que foi para o laboratório. Começámos, interessadíssimos, a produzir trabalho, algo que hoje é comum e banal, mas que, na altura, revelava uma atitude visionária do Professor que nos convidou, e era algo extremamente interessante e estimulante para um aluno de Medicina”, recorda.

A proposta para que este laboratório se tornasse no Centro de Imunologia surgiu mais tarde, e foi apresentada à JNICT, Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica [atual FCT - Fundação para a Ciência e a Tecnologia].

“Posteriormente, o Centro de Imunologia passou a Instituto de Imunologia, quando a FMUC entendeu fazer essa clarificação entre as diversas estruturas que a integram, de acordo com os Estatutos desta unidade orgânica”, esclarece Manuel Santos Rosa.


Os recursos humanos e as instalações
Durante os já largos anos de funcionamento, o Instituto de Imunologia foi, naturalmente, contando com a colaboração de diversas pessoas. “Nesse sentido, houve imensas modificações. Chegámos a ter mais de 20 pessoas a trabalharem no instituto, mas, neste momento, do ponto de vista do trabalho laboratorial, somos pouquíssimos… Diria que, para além de mim, há apenas mais duas pessoas, na parte técnica, que pertencem aos quadros”, refere, “e depois, temos, claro, os docentes da área da Imunologia, que estão também disponíveis para nos apoiar, e ainda alunos e colaboradores”.

Quanto às instalações, no Polo I, Manuel Santos Rosa considera que, embora as suas condições sejam boas, estas acabam por estar fora daquele que deveria ser o seu local ideal: o Polo III. “Isso prejudica o funcionamento do instituto, pela dificuldade de acessibilidade e também por não haver um contacto direto e permanente com os outros grupos”, lamenta.


A experiência na coordenação
A ligação de Manuel Santos Rosa ao Instituto de Imunologia é longa, tendo começado quando ainda era estudante, conforme referido anteriormente. Já a atividade enquanto diretor do instituto começou há quase 30 anos, quando, após o seu doutoramento, foi, progressivamente, assumindo alguma da coordenação do instituto. “Quando o Professor [António José de Amorim Robalo Cordeiro] se aposentou, passei então a ser eu o coordenador”, indica.

“Quando entrei enquanto aluno e já no início das minhas funções como coordenador, o Instituto de Imunologia era, sobretudo, uma estrutura de apoio às unidades curriculares lecionadas na FMUC e de prestação de serviços à comunidade”, refere. “Também acho interessante salientar que, nesses anos já remotos, das décadas de 70, 80 e até 90, a produção científica estava muito vocacionada para a apresentação, e não para a publicação”, acrescenta.

Manuel Santos Rosa refere que, nessa altura, o “o core business da investigação” era a participação em reuniões científicas nacionais e internacionais, nas quais o trabalho pudesse ser mostrado e se pudessem, igualmente, encontrar outras equipas que desenvolvessem o mesmo tipo de trabalho. “Estas reuniões eram importantíssimas até para o relacionamento entre investigadores, num tempo em que não havia telemóveis nem Internet, e em que a comunicação remota era difícil”, observa.

O diretor do Instituto de Imunologia indica que, deste modo, as reuniões científicas eram o grande veículo de divulgação de trabalhos de investigação. “Por isso, foram tempos em que, para além da prestação de serviços, tínhamos uma atividade científica muito vasta neste campo de organização e de prestação científica em reuniões. Chegámos a fazer, aqui em Coimbra, uma reunião científica que contou com vários laureados com o Nobel da Imunologia, como Nils Jerne [1984] e Susumu Tonegawa [1987], algo que hoje teria um impacto enorme. Fomos pioneiros na formação prática em imunologia e na introdução de técnicas como a citometria de fluxo e cell sorting”, destaca.

E se a ligação de Manuel Santos Rosa ao Instituto de Imunologia é longa, a sua experiência também, como é natural. Por isso, indica que as dificuldades sentidas no desempenho das suas funções têm sido muito diferentes ao longo dos anos. “Antigamente, para termos acesso a informações científicas mais recentes que não fossem as publicações em papel que recebíamos, tínhamos de ir a Lisboa”, recorda, “e, para termos determinados materiais de laboratório, fui mais do que uma vez a Paris para comprá-los, dado que, em Portugal, não existia simplesmente o material de que precisávamos”.


Atualmente, as dificuldades são outras. “Talvez a maior dificuldade da Imunologia seja, desde logo, a sua abrangência… Tornou-se numa ferramenta tão transversal que é impossível sabermos tudo sobre ela”, observa. “Há muitas áreas de grande interesse imunológico, e para fazermos boa investigação nessas áreas é necessário um financiamento enorme”, afirma, “quer em equipamento, que tem de ser renovado com muita frequência – algo que, há alguns anos, não acontecida, visto que o equipamento tinha uma grande durabilidade e mantinha-se competitivo –, quer nos próprios reagentes e materiais mais específicos, que têm também grandes custos”.


O futuro do instituto e o balanço do percurso na FMUC
Manuel Santos Rosa jubila-se no próximo mês de junho. No que respeita ao futuro do Instituto de Imunologia, diz estar muito tranquilo e confiante, por considerar que as pessoas que com este colaboram são extremamente dedicadas. “É uma equipa interessada, de excelente formação, com uma mistura equilibrada de pessoas da área clínica e de pessoas da área não clínica. Acho fundamental, em áreas como esta, existir uma ponte entre aquilo que são as realidades clínicas e os desafios clínicos e aquilo que é a capacidade de investigar e de trabalhar em laboratório”, refere.

Todavia, ressalva que uma equipa maior, “a trabalhar a cem por cento na Imunologia”, seria, seguramente, algo que Manuel Santos Rosa gostaria que o instituto tivesse. “Curiosamente, houve muitas pessoas que se doutoraram através da Imunologia, ou com o nosso apoio. Nesse sentido, temos alguns clínicos que se mantiveram a colaborar com o instituto, mas outros que, naturalmente, seguiram a atividade nas suas especialidades médicas”, afirma.

Quanto à reflexão que faz do seu percurso na FMUC, refere que, por ser longo, teve, “evidentemente, altos e baixos”, embora o balanço seja positivo. “Acho que a Imunologia se afirma atualmente como uma ferramenta transversal, e aquilo que mais nos agrada é percebermos que as pessoas se aproximam da Imunologia por dela precisarem, quer como conceito ou como ferramenta, como algo que pode melhorar a sua investigação e a sua compreensão da patologia humana”, destaca.

A um nível mais pessoal, Manuel Santos Rosa confessa que “existe sempre uma certa insatisfação”, por considerar que existe, igualmente, sempre mais a ser feito. “Isso aprendi com o Professor Robalo Cordeiro, que dizia que devemos sempre ser inquietos, não no sentido de andarmos desgastados ou com stresse, mas inquietos no sentido de nunca estarmos satisfeitos com aquilo que temos e que fazemos”, conta.

“Essa inquietação, sempre a tive e continuo a ter. E, no dia em que me jubilar, vou continuar a tê-la, já não relativamente ao Instituto de Imunologia, mas a outras coisas!”, graceja. “Posso dizer que me sinto feliz, com o meu trajeto e com a dedicação daqueles que têm trabalhado comigo, e isso é muito bom”, conclui.

por Luísa Carvalho Carreira
fotografias gentilmente cedidas por Manuel Santos Rosa