Lucerna

Um percurso não se constrói em linha reta, nem sequer com angulações suaves. Ainda que no fim se deslinde o fio condutor, ele é muitas vezes invisível ao olhar próximo, quando o procuramos, no caminho.

Se tiver que escrever algo sobre mim, o meu percurso e a razão pela qual me candidatei ao Programa Doutoral é simples: vontade de aprender. É talvez o que melhor me defina e a pequena luz que sigo. Mais do que um momento “Eureka”, uma grande descoberta ou um determinado contexto em que se encontra um motivo para o que se vai fazer.

Também me é difícil descrever um percurso que ainda creio nos primeiros degraus. Talvez seja essa também uma caraterística. Pois, por cada conquista, por cada conhecimento que adquiro há novas dúvidas e novos degraus a descobrir. Mas o que mais gosto é de aprender. É realmente o que me fascina e me move.

Desde que me lembro quero ser cientista. Compreender o Mundo e dar uma utilidade prática a esse conhecimento. É o fio condutor. Cada um dos passos para o seguir tem exigido trabalho e sacrifício. Desde o percurso escolar na Madeira ao Ensino Superior e que culminou com a Especialidade em Medicina Geral e Familiar.

Tive a sorte de encontrar excelentes Professores. Todos, ensinaram-me muito.

No meu currículo de final de Especialidade em Medicina Geral e Familiar citei Goethe:

Só sabemos com exatidão quando sabemos pouco;
à medida que vamos adquirindo conhecimentos, instala-se a dúvida. 

Foi talvez aí, após terminar esse percurso exigente que culminaria com atividade profissional, que tive a consciência crescente do quanto não sabia. Então, compreendi que a ignorância é, em si mesma, uma descoberta. Não é necessariamente um ponto de partida, mas sim - comigo muitas vezes - o final de um caminho.

A perceção do Desconhecido necessita de um processo mais ou menos longo de conhecimento, mas será tanto maior quanto mais se estude.

O ingresso no Mestrado em Investigação Biomédica é um passo marcante de retorno à vida académica e de aproximação à investigação. Gostava de ser capaz de responder a dúvidas que nos assolam todos e à incerteza que muitas vezes guia a prática. Tenho, no entanto, alguma dificuldade de concentrar toda a minha atenção num ponto muito pequeno. Daí a escolha por uma especialidade generalista e uma apetência por muitas áreas tantas vezes pouco relacionadas. É talvez o movimento contrário à tendência geral a que assistimos. O paradigma da hiperespecialização não é exclusivo da Medicina. Porém, acredito que quando me foco numa pequena área que consiga compreender na plenitude arrisco-me a deixar uma grande parte por conhecer. É a minha forma de estar e pensar:

- Ainda que conheça de forma exaustiva uma doença, um mecanismo específico, uma molécula, a Natureza é muito maior que isso.

Como poderei compreender uma árvore se olhar apenas uma parte da sua folha através de uma lupa?


Gil Correia é aluno do Doutoramento em Ciências da Saúde da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra.

Lucerna

Ilustração por Ana Catarina Lopes