Editorial

É quase Natal... Mais um... Este, inesperadamente, tão diferente de todos os outros que celebrámos. Entre a última época natalícia e os dias que hoje vivemos muito aconteceu. O mundo não é mais o mesmo. As pessoas mudaram... as distâncias que nos separam são agora maiores. As relações tiveram que adaptar-se a novas regras. A manifestação dos nossos afetos já não é o que era. Quando queremos estar próximos, há sempre um cotovelo de distância que nos é imposto. Quando queremos fazer-nos valer de um sorriso empático, há sempre uma máscara a impedir. Essa mesma máscara que não nos deixa ser discretos e trocar palavras silenciosas de cumplicidade.

Seguramente que estará para breve o momento de deixarmos cair a máscara, mas, até lá, não podemos baixar a guarda. Para que possamos repor os afetos em falta e os abraços que têm ficado por dar, é essencial que tenhamos um comportamento responsável, cumprindo e respeitando, integral e escrupulosamente, as regras de segurança. Independentemente do sucesso que venham a ter as vacinas que se anunciam, o êxito no combate a esta pandemia devastadora vai depender da atitude de cada um de nós.

Não podemos deixar que este vírus nos continue a privar, durante muito mais tempo, de liberdade e a roubar aqueles que nos são queridos. A receita para isso, embora pouco agradável e apetecível, é simples de seguir e um pequeno esforço nesta fase pode valer o retorno, em breve, a uma normalidade que tanto ansiamos e necessitamos. Nos últimos dias tem-se redobrado a esperança numa vacina que nos retire desta agonia. Um enorme investimento na ciência e um tremendo esforço dos cientistas permite olhar o futuro próximo com otimismo.

A receita, mais uma vez, é simples... investimento na ciência! Algo que não parece estar a acontecer em Portugal. É verdade que a COVID-19 está a ter um enorme impacto na saúde global, mas não é menos verdade que existem muitas outras doenças que continuam, infelizmente, a matar mais do que a COVID-19. A resolução dos males do mundo não passa apenas pelo combate, circunstancial, a esta pandemia. Outras doenças, porventura mais letais, devem continuar a merecer a nossa atenção.

Se muitas oportunidades de apoio têm sido dadas à investigação na COVID-19, em relação a outras áreas, o investimento tem sido modesto. Por exemplo, no último concurso lançado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), para apoio a projetos de investigação científica em todas as áreas do conhecimento, a taxa de aprovação foi, pasme-se, 5%. Isto é uma brincadeira, de mau gosto, diga-se, quando se sabe que taxas de aprovação inferiores a 15% não estão a premiar a excelência, mas a dar azo a que a sorte e aleatoriedade sejam os determinantes do parco sucesso.

Neste concurso, apenas um em cada 20 investigadores doutorados teve apoio para o seu trabalho de investigação. E o que acontece aos outros 19? Têm que penar três longos anos à espera de nova oportunidade? E o que esperam estes laboratórios, que assumiram responsabilidades na orientação de alunos, muitos de doutoramento com financiamento da mesma instituição que não apoia os projetos necessários para suportar a sua formação? É difícil (sobre)viver assim, nesta precariedade e imprevisibilidade. O desânimo e a frustração que se apoderam da comunidade científica têm, naturalmente, um impacto muito nefasto a médio-longo prazo, no que diz respeito ao desenvolvimento científico e tecnológico em Portugal. Mas seguramente que os nossos dirigentes políticos saberão o que estão a fazer...

Ainda assim, nem tudo é mau! Em 4´33´´, vamos conhecer Bárbara Gomes, que foi recentemente premiada com 1,8 milhões de euros, num financiamento concedido pelo prestigiado European Research Council (ERC). Nesta conversa, Bárbara Gomes conta-nos os principais objetivos deste seu projeto, na área dos cuidados paliativos, que aborda a preferência pelos locais onde se pretende morrer, quebrando alguns tabus quanto ao tema dos cuidados em fim de vida.

A Professora Helena Saldanha, em “Do curso de Medicina”, pinta-nos o quadro da sua vida, com tons que cruzam a arte e a medicina. Descubra ainda como Picasso e outros artistas quase convenceram Helena Saldanha a deixar a medicina e dedicar-se a “outras” artes.

Na rubrica “Isto é FMUC”, Raquel Santiago mostra-nos, através de uma visita pelo Biotério da Faculdade de Medicina, como são mantidos os animais para experimentação. Dúvidas ainda houvesse, para os menos informados e esclarecidos, esta é uma oportunidade para perceber como neste espaço se respeita e se fazem cumprir todas as regras e procedimentos que garantem a dignidade e o bem-estar animal.

O Museu Machado de Castro, recentemente agraciado com o prémio Piranesi – Prix de Rome, de arquitetura, merece o nosso destaque em “Fora da Medicina”. Aqui pode ficar a saber como se pode dirigir a este Fórum Romano, dos primeiros anos da Era Cristã, e conhecer as suas exposições, sem sair de casa.

E Inês Costa, gestora de ciência do GGI-FMUC, prescreve-nos Ennio Morricone, para desfrutar do silêncio da Serra da Estrela e refletir sobre os limites da moralidade.

Protejam-se... para o bem de todos!


Henrique Girão



Voltar à newsletter #20