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Lino Ferreira

VOICEmed
Lidera, desde o final de 2016, um programa ‘ERA Chair’ na área do Envelhecimento, que combina esta área com a da Bioengenharia. Lino Ferreira faz uma avaliação positiva do trabalho desenvolvido neste âmbito, que considera contribuir também para a visibilidade e promoção da Universidade de Coimbra (UC).


No âmbito de uma ‘European Research Area – ERA Chair’, tem liderado uma investigação que estuda o envelhecimento cardiovascular. Em que consiste esse projeto?
O projeto pretende desenvolver modelos e terapias para o tratamento do envelhecimento cardiovascular.

No contexto dos modelos, utilizamos um determinado tipo de células estaminais, chamadas células estaminais pluripotentes induzidas, para podermos desenvolver modelos envelhecidos de tecido cardiovascular. A nossa contribuição, para além de desenvolvermos o modelo, é estudarmos depois, em laboratório e de uma forma mais controlada, processos que, de outra forma, seriam difíceis de estudar em modelo animal ou mesmo em amostras clínicas.
No que diz respeito às terapias, identificados alguns destes ‘targets’ nos modelos, pretendemos desenvolver sistemas inteligentes e avançados que possam entregar, de uma forma controlada, esses fatores para atenuar o efeito do envelhecimento.


Sabemos que as doenças cardiovasculares são a principal causa de mortalidade e morbilidade em Portugal. De que forma a sua investigação pode vir a ter aplicação prática nestas doenças, ou na sua prevenção?
As terapias que nós estamos a estudar poderão ser uma alternativa às já existentes, isto é, fazem parte de terapias avançadas que estão a ser avaliadas em modelos pré-clínicos.

A nossa expetativa é que algumas destas terapias possam vir a ser testadas em contexto clínico. Temos, aliás, uma longa experiência no estudo e utilização de terapias, que podem ser de base celular ou não celular, para o tratamento de doenças cardiovasculares, colaborando maioritariamente com equipas médicas da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC).


E no que diz respeito ao envelhecimento, como se investigam as suas causas?
Na questão do envelhecimento, temos trabalhado, essencialmente, em duas áreas. Uma delas tem a ver com a utilização de um modelo patológico de envelhecimento acelerado, chamado progeria, que nos ajuda a perceber, de uma forma rápida, processos biológicos que estão na origem do processo de envelhecimento.

Na verdade, há vários processos que são partilhados entre o envelhecimento patológico e fisiológico. Essa tem sido uma das nossas contribuições para o estudo das causas do envelhecimento, sobretudo no que diz respeito à parte vascular, sendo que, neste momento, já estamos também a fazê-lo em relação à parte cardíaca.
 
Ou seja, por um lado, temos tentado perceber um pouco melhor quais são os mecanismos que despoletam o processo de envelhecimento focado na vasculatura e também no coração.

Por outro lado, trabalhamos numa segunda área que tem a ver com o estudo da matriz extracelular. Nas últimas décadas, a investigação internacional tem-se focado, sobretudo, em fatores que são secretados pelas células e que podem induzir processos de envelhecimento.

Nós estamos a focar a nossa investigação na parte insolúvel, estudando o efeito que a matriz extracelular pode ter no processo de envelhecimento de tecidos e de órgãos.


Enquanto ‘ERA Chair holder’ - e tendo presente a missão e os objetivos destas iniciativas - que balanço faz da sua contribuição para a melhoria e promoção da investigação na FMUC?
Fazendo uma auto-análise daquilo que foram estes anos como ‘ERA Chair holder’, eu julgo que a equipa ERA Chair contribuiu para o aumento da visibilidade desta área de investigação na região Centro e a nível nacional.

Esta é uma área estratégica da Universidade de Coimbra (UC) e a nossa contribuição foi talvez diferenciada, no contexto internacional, porque combinámos duas áreas que normalmente não dialogam entre si e que são o Envelhecimento e a Bioengenharia. Por isso, presumo que tenhamos contribuído para o avanço da ciência, explorando caminhos e ferramentas que nunca tinham sido utilizados.

Sob o ponto de vista da formação, temos contribuído para a criação de conteúdos para disciplinas académicas e participado em Programas de Mestrado e Doutorais no sentido de formarmos pessoas na área do Envelhecimento e Medicina Regenerativa.
 
Depois, sob o ponto de vista da inovação, temos contribuído com propriedade intelectual que, embora precise de ser amadurecida, constitui uma semente importante para projetos de criação de valor e emprego.

Por isso, a todos estes níveis, penso que fizemos uma contribuição que ajuda toda a UC a crescer e a ter visibilidade nesta área.

 

 



O Instituto Multidisciplinar do Envelhecimento (MIA-Portugal) terá a sua sede em Coimbra, região reconhecida, pela Comissão Europeia, enquanto referência para o envelhecimento ativo e saudável. Como vê o panorama da investigação nacional nesta área e que impacto considera ter a construção deste instituto em Coimbra?
Eu acho que a investigação em envelhecimento tem crescido muito nos últimos anos, não só na região Centro, mas também a nível nacional. Há vários grupos interessados em investigar este tópico sob diferentes perspetivas e eu presumo que esta comunidade vá aumentar em número e em qualidade nos próximos anos.  

A isto, acresce o facto de ter surgido o MIA-Portugal, que é não só o primeiro centro no País, como também o primeiro no sul da Europa na área do envelhecimento. Julgo que é uma grande responsabilidade para a UC, mas também uma grande oportunidade para atrair uma equipa jovem que possa realmente desenvolver ainda mais a investigação em envelhecimento.

Acho que existe uma combinação de vários fatores que ajudam a que Coimbra possa ter cada vez mais relevo nesta área, tanto na componente de investigação quanto na componente social. Na investigação, o CIBB [Centro de Inovação em Biomedicina e Biotecnologia] contribui, já há vários anos, para a investigação em doenças relacionadas com o envelhecimento. Na componente social, a criação do consórcio Ageing@Coimbra tem mobilizado agentes sociais, empresas, municípios, Universidades e centros tecnológicos para a área do envelhecimento. Ou seja, para além da componente científica, existe também uma componente social, que é muito importante.

Depois, existe ainda um terceiro fator, que tem a ver com o próprio historial

demográfico da região Centro, que tem uma população envelhecida, e que acaba por fazer desta região uma espécie de laboratório vivo para se poder investigar melhor o processo de envelhecimento e desenvolver intervenções que contribuam para um envelhecimento saudável.


Hoje vivemos mais tempo, o que não significa que vivamos melhor. Algo que poderá estar relacionado com a falta de uma correta prevenção de diversas patologias. Que papel considera ter a partilha das descobertas científicas com a sociedade, nomeadamente daquelas relacionadas com a Medicina e a Saúde?
Há pouco, quando falava da formação de novas pessoas com sensibilidade para a área do envelhecimento, referia-me à componente técnica, de formar novos profissionais, mas, de certa forma, também me referia à sensibilidade para a criação de novos hábitos e de novas políticas institucionais para se poder contribuir para um aumento do número de anos saudáveis da população.  

A componente de comunicação com o público em geral é muito importante e tem decorrido principalmente através de iniciativas de divulgação nos meios de comunicação social.

Mas existem outras formas de comunicar com o público. Neste momento, por exemplo, foi submetida uma candidatura para a criação de um Laboratório Colaborativo [CoLAB] na região Centro nesta área do envelhecimento, que pretende, de alguma forma, congregar vários interlocutores, como estruturas de cuidados primários, hospitais, empresas, Universidade e também um centro de translação tecnológica, que possa informar o público em geral e também desenvolver uma cultura de criação de valor nesta área. Acho que essa mensagem tem, aos poucos, chegado a todos e vai continuar a chegar cada vez mais.


por Luísa Carvalho Carreira
fotografias gentilmente cedidas por Lino Ferrerira 


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