Quando pensamos nos momentos marcantes da nossa vida profissional, podemos pensar nos momentos cientificamente grandiosos (como a emoção de ouvir o nosso nome para receber o prémio de melhor trabalho científico ou a alegria de receber o e-mail com resposta favorável à publicação de um artigo), nos momentos que envolvem a apaixonada tomada de decisões importantes (como a escolha que fiz pela especialidade de Ginecologia/Obstetrícia) ou na felicidade que sentimos quando um doente nos olha nos olhos e pede para nos abraçar em gratidão pelo nosso trabalho.
Com o exercício da Medicina fui percebendo o impacto de todas as nossas atitudes em cada doente que se cruza connosco. Não apenas na vida de milhares de doentes, mas também na vida de milhares de famílias e amigos que, direta ou indiretamente, ficam ligados às nossas atitudes, às nossas escolhas, aos nossos sucessos e fracassos.
Como Médicos temos esse poder. Podemos tratar um doente e influenciar positivamente toda a sua vida ou podemos fazer escolhas erradas e condicionar até um desfecho fatal. Muito depende de nós. Do nosso estudo, do nosso empenho, do nosso senso clínico, das nossas escolhas, da forma como comunicamos com o nosso doente e com quem nos rodeia.
Como Investigadores em Medicina esse poder torna-se exponencialmente maior. Podemos melhorar a vida não apenas dos nossos doentes, mas de toda uma população com essa doença. Cada pequeno passo que avançamos no conhecimento pode significar melhorias na qualidade de vida ou até na sobrevida.
Após entrar no Internato de Ginecologia/Obstetrícia a vontade de investigar foi crescente e, inevitavelmente, concorri ao Portugal Clinical Scholars Research Training da Harvard Medical School. Talvez tenha sido este o verdadeiro momento de viragem. Foi nesta fase que a investigação clínica se tornou numa peça-chave da minha prática médica e que percebi que incluir a investigação e o ensino no meu trajeto profissional era obrigatório. O passo seguinte foi a entrada no Programa de Doutoramento e o início da minha atividade como Assistente Convidada de Ginecologia.
Atualmente sou especialista em Ginecologia/Obstetrícia, dedicada à área do cancro da mama, e tenho o privilégio de poder desenvolver três atividades que me apaixonam: prática clínica, investigação e ensino médico. Se poderia ter uma vida profissional mais tranquila? Sim, mas não tão plena! Por isso, a todos os colegas que perguntam se a investigação e o ensino valem a pena a resposta fica numa simples questão: seríamos tão bons médicos hoje se continuássemos a tratar os nossos doentes apenas com os conhecimentos de há 20 anos?
Inês Gante é aluna do Doutoramento em Ciências da Saúde da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra.
Ilustração por Ana Catarina Lopes