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Manuel Santos Rosa 

Professor catedrático da Faculdade de Medicina (FMUC) e diretor da Biblioteca das Ciências da Saúde da Universidade de Coimbra, Manuel Santos Rosa é também presidente da Assembleia da FMUC. Um órgão de gestão que refere ser essencialmente reflexivo e de extrema importância para o bom funcionamento da Escola.

Quais são as principais metas que pretende alcançar enquanto presidente da Assembleia da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC)?
Há uma contextualização que é importante fazer-se em relação à Assembleia, que é o facto de ser a única estrutura funcional da FMUC na qual têm assento todos os elementos que a constituem, desde os trabalhadores não docentes e não investigadores, aos próprios docentes e investigadores e aos estudantes dos três ciclos de estudos. Isso dá-lhe uma capacidade particularmente diferente: pode fazer-se uma troca de ideias e uma apreciação das coisas de uma forma muito mais plural.

Aquilo que me parece interessante fazer, enquanto presidente da Assembleia, é poder potencializar esse grupo humano, no sentido de melhor aproveitarmos tudo aquilo que possamos saber da Faculdade, no presente, para melhorarmos o futuro. Prova disso é o facto de termos vindo a assumir, nas reuniões mensais da Assembleia, o debate de temas que consideramos importantes no contexto da Faculdade, quer do presente, quer do futuro, não esquecendo, obviamente, o passado. Como dizem, o mais importante é refletirmos, não sobre aquilo que correu bem, mas sobre o que correu mal, para podermos, futuramente, evitar ou melhorar essas situações.

Nessa apreciação temática, o primeiro tema debatido na primeira reunião desta Assembleia foi a atratividade da investigação no contexto do ensino da FMUC. No Mestrado Integrado em Medicina (MIM) e no Mestrado Integrado em Medicina Dentária (MIMD), existem várias unidades curriculares de investigação. O facto é que se percebe que não temos o número de alunos desejável nas mesmas, ou seja, não estamos, enquanto faculdade, a conseguir fazer com que a investigação seja atrativa para os alunos. O que achamos é que a FMUC, quer na vertente de Medicina, quer na de Medicina Dentária, deve, não só formar médicos e médicos dentistas, mas também cientistas, não simplesmente cientistas investigadores, mas também médicos investigadores.

É extremamente importante, tanto no contexto da Saúde atual, como futuro, que um médico sinta também este apelo da investigação. Se não formos atrativos, isso não vai acontecer. Foi por isso que fizemos um debate acerca desta questão na Assembleia, identificando, igualmente, outras questões importantes que devem ser mudadas ou melhoradas.

Outra meta da Assembleia, para além da identificação de temas importantes, é transportar esses temas para o diretor da FMUC. A Assembleia não é um órgão meramente fiscalizador ou apreciador do que acontece na Escola: pretende-se que
possa coadjuvar e acompanhar o trabalho do diretor. Só assim os mandatos do diretor e da Assembleia terão o maior sucesso possível no rendimento da Escola e no seu trabalho.

Pretende-se também que a Assembleia possa ser um órgão que tenha uma estratégia, não como a elencada num Plano Estratégico, no qual existem objetivos e se mede o seu sucesso através de métricas, mas, sobretudo, uma estratégia particular. A estratégia não se limita à definição de objetivos: resulta de decisões que derivam de opções, às quais apenas chegamos após uma reflexão alargada.

Esta reflexão alargada vai ao encontro daquilo a que muitas vezes chamamos de “fazer universidade”, isto é, debatermos livremente os temas. A Assembleia é, realmente, um órgão de reflexão, que identifica estratégias, obviamente inseridas em planos de ação e em métricas e objetivos que queremos cumprir.


Falou do primeiro debate da Assembleia, no qual discutiram a questão da atratividade da investigação na FMUC, enquanto uma necessidade e também um desafio da Faculdade. E em termos pessoais, quais têm sido os maiores desafios do cargo que desempenha na Assembleia?
Penso que o desafio básico decorre do que acontece a todos os universitários, que é o de gostarmos de ver, colocado na prática, aquilo que, anteriormente, foi teorizado. Os órgãos de reflexão são órgãos que não transportam diretamente o seu trabalho para a prática. Talvez esse seja, para mim, um desafio importante.

Gostaria muito que aquilo que é teorizado num órgão não executivo, como é o caso da Assembleia da FMUC, se pudesse transportar para a prática. Temos, para além da missão de reflexão, outra que considero muito importante, que é estarmos próximos de todos. Por essa razão, muitas das reuniões futuras da Assembleia serão descentralizadas, não ocorrendo na Unidade Central da FMUC, no Polo III, mas sim nas várias estruturas onde se ensinam a Medicina e a Medicina Dentária, como no edifício do Polo I, mas, também, nas estruturas hospitalares do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC).

Um outro desafio, mas que acho que é um desafio plenamente conseguido e é uma das coisas que me tem deixado muito satisfeito enquanto presidente da Assembleia, é o facto de, sendo a Assembleia constituída por pessoas diferentes, com uma heterogeneidade significativa, haver um ambiente excecionalmente bom. Todos nós estamos ali por querermos criar uma mais-valia para a estrutura em que nos inscrevemos. Isso é muito recompensador, perceber que há essa vontade conjunta.


Nesse contexto, que papel considera ter a Assembleia na dinâmica da Escola? Porque, como referiu, é uma estrutura que não tem a pressão da parte executiva, sendo, de uma maneira geral, um órgão de reflexão. Mas essas reflexões também podem vir a traduzir-se em aspetos práticos. Poderá ser esse, o de promover um maior envolvimento entre todas as pessoas que constituem a FMUC?
O princípio que mais me motiva a nível de uma instituição universitária é podermos, em cada estrato dessa estrutura, contribuir para uma maior projeção da instituição. Tudo aquilo que a Assembleia possa fazer de positivo e que seja transportado para a Faculdade e, consequentemente, para a Universidade de Coimbra (UC), resultará numa cadeia de mais valor. Teremos, deste modo, uma UC mais forte na área das Ciências da Saúde e, por isso, uma FMUC igualmente mais forte e uma Assembleia que também terá maior capacidade de intervenção. Este é o princípio da cadeia amplificadora: não devemos pensar, meramente, em querer ter ações de muito brilho na Assembleia, mas que depois não tenham repercussão na própria Faculdade e na UC.

Mas é evidente que a Assembleia, embora, estatutariamente, esteja confinada a poucos itens e muitas vezes se considere que aquilo que de mais importante faz é eleger o eleitor – e obviamente que esta é uma tarefa importante – desempenha também outras atividades. A Assembleia já contempla, neste momento, um planeamento estratégico nos seus estatutos. Ou seja, é um órgão que acompanha a missão do diretor da FMUC, mas que, de acordo com a sua estratégia, quer fazê-lo de uma forma muito mais próxima. Pretendemos municiar o diretor das nossas reflexões, tentando, com isso, melhorar ou estimular o trabalho da direção, em vez de apenas ouvirmos o diretor, semestralmente, acerca daquilo que tem sido o desenvolvimento das propostas que apresentou à Assembleia, aquando da sua candidatura ao cargo.

Manuel Santos Rosa

Por outro lado, queremos aproximar-nos dos nossos eleitores. A Assembleia é eleita por um grupo alargado, de membros de toda a Faculdade; portanto, não nos devemos esquecer que, se pertencemos a uma Assembleia, é porque fomos eleitos, e que esses eleitores são os nossos escrutinadores primários. Considero fundamental ouvi-los e estar próximo deles. Além disso, a Assembleia está sempre disponível para todos. Qualquer pessoa que me queira interpelar, formal ou informalmente, poderá fazê-lo e, obviamente, eu serei sempre um veículo de transmissão para a Assembleia das preocupações de cada um. Mas, mais importante até do que esse contacto por vontade individual, acho que é podermos estar no terreno, sem essa pressão executiva, fazendo uma apreciação das situações que pode ser muito útil, quer da nossa parte, para ouvir, quer por parte das pessoas que nos querem transmitir aquilo que se passa.

Tentaremos também, nos nossos debates, percebermos como serão o futuro próximo e o futuro um pouco mais longínquo, algo muito importante na área da Medicina: até um médico estar formado, no terreno e com influência sobre os sistemas de Saúde, há uma mediação de tempo enorme. Um médico tem toda uma formação já depois de sair da faculdade que leva a que, quando esteja a influenciar verdadeiramente o sistema de Saúde, já se tenham passado cerca de dez anos desde o início da sua entrada no curso de Medicina.

Para que a Assembleia possa contribuir para um bom desempenho e para a evolução da Faculdade e da UC, não podemos pensar apenas naquilo que vai acontecer daqui a cinco anos. Temos de pensar um pouco mais à frente, e esse pensar deve refletir-se na forma de ensinar e nos objetivos do ensino. Afinal, o que vai ser um médico daqui a 20 anos? Vai ser um médico em que o fundamental é percebermos o envelhecimento? Ou, pelo contrário, as grandes catástrofes, por modificações climatéricas ou outras? Ou os grandes desafios microbiológicos? Ou serão as doenças emergentes? Esta reflexão deve ser feita, mas sempre numa ideia que me parece importante, que é a de não criarmos uma hiperespecialização precoce.

É importante escolhermos áreas de afirmação da Faculdade, mas, na formação básica de um médico, têm de ser considerados os temas que irá encontrar depois, na prática clínica. O “caso raro” não deve ser aquele que norteia o ensino, já que um médico pode nunca vir a ter a oportunidade de contactar com um desses casos ao longo da sua carreira. Por outro lado, não pode falhar na sua formação aquilo que mais verá no seu quotidiano profissional. Nesse âmbito, a Assembleia desempenha um papel importante ao fazer chegar as suas reflexões à direção, contribuindo para um melhor desempenho da Faculdade.


E qual a importância, para si, de ser presidente da Assembleia?
Eu sempre encarei qualquer cargo de uma forma muito simples. Começo sempre por tentar perceber se quero ou não candidatar-me a determinado cargo. E achei que seria motivador poder ser presidente da Assembleia da FMUC, porque já tive a oportunidade de estar em todos os outros órgãos da Faculdade. Achei que estar na Assembleia, pelo facto de ser uma estrutura que congrega os mais diversos elementos, as forças vivas da FMUC, seria bastante interessante.  

Considerei que, sendo a Assembleia um órgão, para além de supervisão, de reflexão, seria importante que o seu presidente pudesse ser alguém com experiência dentro da FMUC, alguém com uma vivência da própria Faculdade: isso motivou-me a ser presidente da Assembleia.

Considero, também, que sou alguém que tenta dinamizar os processos, dando, no entanto, espaço para cada pessoa poder desenvolver o seu trabalho. E acho, precisamente, que a Assembleia deve ser uma estrutura cooperativa, na qual todos estão envolvidos. Não faz sentido falarmos, por exemplo, do ensino e de como devemos dinamizá-lo, apenas com os docentes: um trabalhador não docente ou não investigador também deve intervir nesse debate.


Tendo em conta a sua vasta experiência em cargos desempenhados na Faculdade, inclusive o de diretor, faria, neste momento, alguma mudança, ou considera que a FMUC está no caminho certo?
Por natureza, tenho sempre muitas dúvidas de que estejamos no caminho certo. O caminho certo faz-se com muitos cruzamentos, muitos semáforos e muitas autoestradas. E mesmo quando se vai na autoestrada, devemos pensar se, realmente, muito tempo ali não será cansativo e se não haverá algo mais interessante! Portanto, na minha perspetiva, o caminho certo faz-se por metas. E, por isso, devemos perceber aquilo que queremos para amanhã e aquilo que queremos para um pouco mais além, tentando cumprir essas metas.  

Para mim, o fundamental é ver a FMUC colocada, ano após ano, num patamar que não tem de ser relacionado com rankings, mas sim de perceção. Sou muito favorável àquilo que se chamam as realidades percebidas, a que haja uma perceção, quer dos nossos docentes, investigadores, trabalhadores em geral ou dos próprios estudantes, de que estamos a fazer um trabalho de mérito.  

Também considero importante que Coimbra, a sua área da Saúde e a sua Faculdade de Medicina possam ter a imagem que merecem. Como se percebe, não é fácil, numa cidade pequena como Coimbra, ter a mesma imagem que tem um grande centro, onde a sua transmissão para o exterior está mais facilitada. Acho que é uma missão muito importante da FMUC conseguir promover-se seriamente: não devemos fazer flashes de promoção que depois nos caem aos pés, mas sim promovermo-nos dentro daquilo que são os nossos alicerces sólidos e de qualidade.  

Agora, se é necessário fazer mudanças estruturais importantes na FMUC? Sim, é. E não quero deixar de referir algumas coisas que me preocupam, sendo uma delas, sem dúvida, as instalações. Diria mesmo que a Faculdade está impedida de ter um melhor rendimento pela dificuldade resultante das instalações, nomeadamente, a dispersão existente entre os Polo I e Polo III. O Polo I, neste momento, é uma estrutura que em nada favorece o bom funcionamento da Faculdade, porque está longe, quer para os estudantes, que têm de se deslocar entre os polos, quer para os investigadores. Para além disso, está desinserida do espaço Saúde, digamos assim. Era fundamental que se encontrasse uma solução para a Faculdade estar toda implantada no Polo III.

Outro aspeto extremamente importante é o do ensino clínico. Seria fundamental que houvesse uma capacidade de diálogo entre as respetivas estruturas [FMUC e CHUC], no sentido de fazerem com que o ensino clínico, apesar de realizado fora das instalações da FMUC, pudesse decorrer como decorreria dentro da Faculdade. Ou seja, que os estudantes de Medicina, quando se encontram numa fase em que o ensino acontece em ambiente hospitalar, pudessem ter, também aí, todo o ambiente necessário a uma rentabilização do seu estudo. Isto é algo que, infelizmente, ainda não existe.

Acho que estes dois aspetos seriam fundamentais sob o ponto de vista estrutural. Sob o ponto de vista funcional, continuo a achar que a dimensão de uma Faculdade de Medicina seria, claramente, favorecida com uma maior autonomia. Essa maior autonomia pode dar uma celeridade de decisão e uma competitividade de funcionamento muito superiores. Esta é uma das situações que também gostaria de ver na prática, sempre balizada pelos estatutos da UC e pelo seu próprio futuro. Acho que uma maior autonomia administrativa poderia facilitar o funcionamento de uma unidade com a dimensão da FMUC.


por Luísa Carvalho Carreira 
fotografias de Carina Monteiro Paulo Amaral


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