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José Pereira da Silva

VOICEmed
Foi reeleito presidente da Assembleia da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC). Quais são os objetivos para este mandato?
Neste segundo mandato, o nosso maior objetivo é a construção do plano estratégico da faculdade. É um documento estruturante, previsto pela primeira vez nos estatutos da FMUC, de 2017. Creio que poderá ter, se bem desenhado e implementado, um papel decisivo na preparação da escola para enfrentar o futuro com sucesso, não apenas externa, mas também internamente, de maneira a que trabalhar aqui seja uma fonte de satisfação e realização profissional.


O que significa, para si, ser presidente da assembleia?
A assembleia tinha até há pouco tempo um papel relativamente restrito e tornou-o, na prática, ainda mais limitado do que o regulamento determinava. Considerei imperioso mudar isso, pois é o único órgão que tem a representação dos diversos corpos profissionais da escola, dos alunos (pré-graduado e doutoramento) e de ambas as licenciaturas. No primeiro mandato, utilizámos essa representatividade como forma de identificar problemas relevantes para os diferentes corpos, destacá-los à direção da faculdade, e pedir a sua intervenção na resolução dessas questões. Surgiu também o papel decisivo da Assembleia na elaboração dos estatutos da faculdade, nos quais se previu a elaboração do plano estratégico. Há um fluxo de ideias que podem marcar positivamente o futuro e isso é o mais entusiasmante.


Marcar o seu futuro pessoal?
O meu pouco. Chegado a catedrático, o meu futuro depende pouco, formalmente, do que possa realizar neste cargo. A única coisa que o pode marcar é ajudar a responder a uma necessidade pessoal inalienável: sentir que sou útil e que contribuo para alguma coisa maior do que os meus interesses pessoais. Quero acreditar que o trabalho que atualmente desenvolvemos na FMUC pode ser benéfico para o futuro da instituição, dos estudantes, dos que aqui trabalham e da comunidade. Se assim for, marcará a minha existência e contribuirá para a minha felicidade.


Mantendo essa visão de futuro, como vê a faculdade daqui a dez anos?
Temos duas possibilidades: ou nos alteramos profundamente ou perecemos. A competição, quer nacional, quer internacional, é cada vez maior. Os recursos podem não ser mais escassos em valor absoluto, mas são muito mais competitivos. É indiscutível que a qualidade do que fizermos será o principal determinante de termos ou não futuro. Na minha perspetiva, é chegado o momento de, coletivamente, encararmos esta realidade e fazermos disso uma alavanca estrutural, não só no planeamento e na regulação da escola, mas também no dia-a-dia de trabalho administrativo, académico e científico.

Precisamos de fazer mais e, sobretudo, melhor. Para isso é necessário garantir que definimos, avaliamos, reconhecemos e recompensamos o mérito. Só assim será possível competir pelo recurso mais valioso: o empenho de gente dotada de talento. Aqui reside, a meu ver, o maior desiderato e o maior desafio do planeamento estratégico da FMUC e do seu futuro.
FMUC

Passando para a prática clínica, quais foram as grandes mudanças desde que iniciou as suas funções na reumatologia?
A reumatologia tem o privilégio, com algum mérito, de ter sido uma das especialidades com mais transformações nos últimos anos. Isso deve-se especialmente ao aparecimento de novas moléculas, ditas biológicas, desenhadas pela primeira vez com base num conhecimento fino da fisiopatologia, e dirigidas a alvos muito específicos. Deve-se também a novas estratégias de intervenção terapêutica, mais agressivas e precoces. Os resultados têm sido notáveis: uma transformação radical no panorama das doenças reumáticas imunologicamente mediadas, ou autoimunes, não apenas pelos instrumentos novos que temos, mas pela maravilhosa alteração que levaram à vida das pessoas.

Quando comecei a praticar reumatologia, no final dos anos 1980, o corredor estava frequentemente atravancado com cadeiras de rodas. Hoje, o mais provável é que não encontre aí nenhuma. Esta mudança, do ponto de vista de quem sofre, representa também um alento muito grande para quem faz da reumatologia profissão. Se está aqui pelas razões certas, não pode deixar de se emocionar e motivar com estes avanços. Retirei um prazer muito especial por apresentar um caso particularmente grave de artrite reumatóide no dia que tivemos aqui um prémio Nobel, Bruce Beutler, que foi um dos grandes fundadores desta nova era da terapêutica biotecnológica. Não conseguiu conter a emoção, quando demonstrei o sofrimento imenso que ele tinha ajudado a evitar.


Tendo em conta que muitas das pessoas que trata têm doenças crónicas, como se dá a relação entre o médico e o doente? Há uma atenção especial?
Julgo que é essencial. O médico que não vir e sentir isso deve procurar melhor vida para os seus doentes e para si! Estamos a falar de doenças que têm um impacto profundo na qualidade de vida das pessoas e que se vão manter por toda a sua vida. Isto é muito exigente do ponto vista do médico, porque tem que ser agressivo com as doenças, por saber que elas vão incapacitar o meu doente ou mesmo pôr em risco a sua vida, mas cuidadoso na gestão do risco porque serão tratamentos prolongados.

Do ponto de vista da relação, é particularmente exigente porque o doente carece naturalmente de suporte psicológico para suportar este tipo de doença e porque a relação vai ser longa e exposta a muitos desafios. O médico tem de ter muita atenção a essa relação pessoal, já que ela é decisiva para a qualidade humana do gesto terapêutico, e também para a sua eficácia. Acredito e tento ensinar aos meus alunos que a maior qualidade de um médico reside em ser vendedor de esperança.

O nosso serviço elegeu, desde que sou diretor, o mote "Promover felicidade mediante cuidados de excelência". Vemos nele duas dimensões que prezo muito. A primeira é que devíamos reconhecer que dar saúde física a um doente é um meio para um fim, mas não um fim em si mesmo. O fim é a felicidade, que o doente transforme a sua saúde física em satisfação de viver, contando também aí com o apoio do médico, se necessário. Por outro lado, enquanto profissionais, deveríamos fazer depender a nossa felicidade da excelência dos cuidados que prestamos. Nesta perspetiva o médico é um zelador da felicidade. Que mais pode um profissional de saúde desejar?



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